segunda-feira, junho 20

Queixa e imprecações dum condenado à morte

Bom dia , estes dias não tenho escrito no blog..Queria ter escrito acerca do grupo que se reuiniu no Martim Moniz, infelizmente não estive por cá e não consegui ver nenhuma imagem, informação, ou discurso dessas pessoas, sei apenas o que me contaram.Tenho a minha opinião acerca disso e espero expressar-me lá para terça feira, por enquanto queria deixar um poema que eu adoro, talvez seja o que mais gosto de todos os que li, um poema de luta, de vida e a certeza de que não permitiremos que tal não volte acontecer...Mas..temos de estar atentos, porque censura e descriminação politica acontece em portugal, umas vezes de uma forma que o ódio não deixa esconder outras mais disfarcadas e subliminares como no caso da tv...Não quero falar mais sobre isso, hoje é dia de estudo..comprimentos e abraços!!!


Queixa e imprecações dum condenado à morte


Por existir me cegam,
Me estrangulam,
Me julgam,
Me condenam,
Me esfacelam.
Por me sonhar em vez de ser me insultam,
Por não dormir me culpam
E me dão o silêncio por carrasco
E a solidão por cela.
Por lhes falar, proíbem-me as palavras,
Por lhes doer, censuram-me o desejo
E marcam-me o destino a vergastadas
Pois não ousam morder o meu corpo de beijos.

Passo a passo os encontro no caminho
Que os deuses e o sangue me traçaram.
E negando-me, bebem do meu vinho
E roubam um lugar na minha cama
E comem deste pão que as minhas mãos infames amassaram.
Com angústia e com lama.

Passo a passo os encontro no caminho.
Mas eu sigo sozinho!
Dono dos ventos que me arremessaram,
Senhor dos tempos que me destruíram,
Herói dos homens que me derrubaram,
Macho das coisas que me possuíram.

Andando entre eles invento as passadas
Que hão-de em triunfo conduzir-me à morte
E as horas que sei que me estão contadas,
Deslumbram-me e correm, sem que isso me importe.

Sou eu que me chamo nas vozes que oiço,
Sou eu quem se ri nos dentes que ranjo,
Sou eu quem me corto a mim mesmo o pescoço,
Sou eu que sou doido, sou eu que sou anjo.

Sou eu que passeio as correntes e as asas
Por sobre as cidades que vou destruindo,
Sou eu o incêndio que lhes devora as casas,
O ladrão que entra quando estão dormindo.

Sou eu quem de noite lhes perturba o sono,
Lhes frustra o amor, lhes aperta a garganta.
Sou eu que os enforco numa corda de sonho
Que apodrece e cai mal o sol se levanta.

Sou eu quem de dia lhes cicia o tédio,
O tédio que pensam, que bebem e comem,
O tédio de serem sem nenhum remédio
A perfeita imagem do que for um homem.

Sou eu que partindo aos poucos lhes deixo
Uma herança de pragas e animais nocivos.
Sou eu que morrendo lhes segredo o horror
de serem inúteis e ficarem vivos.

Ary dos Santos

sexta-feira, junho 17

Alvaro Cunhal por Jorge Amado

Andava pela net na pesquisa e encontrei isto..um texto de Jorge Amado sobre Álvaro Cunhal publicado no jornal "Imprensa Popular" em Outubro de 1953.Aqui vai:


«Tão magro, de magreza impressionante, chupado a face fina e severa, as mãos nervosas, dessas mãos que falam, mal penteado o cabelo, um homem jovem mas fisicamente sofrido, homem de noites mal dormidas, de pouso incerto, de responsabilidades imensas e de trabalho infatigável, eu o vejo, sentado ao outro lado da mesa, diante de mim, falando com a sua voz um pouco rouca, os olhos ardentes no fundo de um longo e sempre vencido cansaço, e o vejo agora como há cinco anos passados, sua impressionante e inesquecível imagem: Álvaro Cunhal, conhecido por Duarte, o revolucionário português. Falava sobre Portugal, sobre que poderia falar?Sua paixão e sua tarefa: libertar o povo português da humilhação salazarista, libertar Portugal dessa já tão larga noite de desgraça, de silêncios medrosos, de vozes comprimidas, de alastrada e permanente fome do povo, de corvos clericais comendo o estômago do país, de tristes inquisidores saídos dos cantos mal iluminados das sacristias e da História para oprimir o povo e vendê-lo à velha cliente inglesa ou ao novo senhor norte-americano. Sua paixão e sua tarefa: fazer de Portugal outra vez um país independente e do povo português um povo novamente livre e farto e dono da sua natural alegria. Ah! Aqueles cansados olhos fundos sorriam e a voz estrangulada de cólera se abria em doçura de palavras de amor para falar de Portugal e do povo português. Eu compreendia que aquele homem de magreza impressionante, de físico combalido pela dura ilegalidade perseguida, era o seu próprio país, seu próprio povo e que, com seu cansaço, sua fadiga de anos, sua rouca voz de velho sono, suas mãos ossudas, eles estava construindo a vida, o dia de amanhã, o mundo novo a nascer das ruínas fatais do salazarismo. Como era terno seu sorriso ao falar das festas populares nas aldeias do Minho ou dos homens rudes de Trás-os-Montes! Conhecia tudo do seu país e do seu povo, tudo o que era autentico de Portugal, desde o mar-oceano com a sua história portuguesa e gloriosa até as vinhas ao sol e as cantigas e os poemas dos poetas reduzidos na sua grandeza pela censura fascista; desde as histórias heróicas dos militantes presos, torturados até à loucura e à morte, as tenebrosas histórias do Tarrafal, o campo de concentração mais antigo e mais cruel da Europa, até às doces histórias de amor da província portuguesa, com um sabor romântico das velhas legendas.
Contou-me coisas de espantar com sua voz ora doce, grávida de ternura, ora violenta de cólera desatada quando falava da fome dos trabalhadores, da opressão salazarista sobre o povo, da opressão imperialista sobre a sua pátria de primavera e mar. (...) os comunistas portugueses, heróis anónimos do povo, os invencíveis, os que estão rasgando a noite fascista com a lâmina de sua audácia e de sua certeza para que novamente o sol da liberdade ilumine o país dos pescadores e das uvas. De um me disse: «Esse esteve no Brasil e aprendeu com vocês» (...)Falou do campo, dos homens que habitam as montanhas, daqueles que Ferreira de Castro, o grande romancista, descreveu em «Terra Fria» e «A Lã e a Neve». (...) Falou dos operários das cidades daqueles que Alves Redol descreveu em seus magníficos romances e contou da sua irredutível resistência ao regime salazarista. (...)Naquela tarde como que me apossei por inteiro de Portugal, do melhor Portugal, do Portugal eterno, como se Álvaro Cunhal o trouxesse nas suas mãos ossudas, tão descarnadas e nervosas, como se trouxesse – e o trazia em verdade – no seu coração de revolucionário e patriota. Voltei a vê-lo ainda uma vez, dias depois, e a longa conversa sobre Portugal continuou. Falou-me dos escritores, dos plásticos, dos pescadores, fadistas, e sobretudo da luta subterrânea, dura e difícil e jamais vencida. (...)Veio o processo, dentro dos métodos infames dos tribunais fascistas. Ali se ergueu Álvaro Cunhal (Militão morrera de torturas) e não era o réu, era o acusador, a voz de fogo a queimar o vergonhoso rosto dos carrascos do seu povo, dos vendilhões da sua pátria.(...)Pretendem matá-lo e nós sabemos que são frios assassinos os que querem matá-lo. É uma vida preciosa, preciosa para Portugal e para o mundo, ajudemos o povo português a salvá-la!(...)Há alguns meses eu estava em frente ao mar Pacífico, na costa sul do Chile, em Isla Negra, em casa de Pablo Neruda, meu companheiro de lutas de esperança. Uma figura de proa de barco se elevava em frente ao mar de ondas altas e violentas. Por isso falámos de Portugal e do seu destino marítimo. Contei ao poeta sobre Cunhal e Pablo levantou-se, deixou-me com o pescador que parara para escutar-nos e quando voltou havia escrito esse maravilhoso poema que é «A Lâmpada Marinha» sobre Portugal, seu povo, Álvaro Cunhal e o dia luminoso de amanhã»(...)Hoje o mais bravo dos filhos desse povo heróico, aquele que tudo sacrificou para ser fiel à esperança do povo está com sua vida ameaçada.»

SOLIDARIEDADE - Mário Dionísio

Vamos, dêem as mãos.

Porquê esse ar de desconfiança?
esse medo? essa raiva?
Porquê essa imensa barreira
entre o Eu e o Nós na natural conjugação do verbo ser?

Vamos, dêem as mãos.

Para quê esses bons-dias, boas-noites,
se é um grunhido apenas e não uma saudação?
Para quê esse sorriso
se é um simples contrair da pele e nada mais?

Vamos, dêem as mãos.

Já que a nossa amargura é a mesma amargura,
já que a miséria, para nós, tem as mesmas sete letras,
já que o sangrar de nossos corpos é o vergão da mesma chicotada,
fiquemos juntos,
sejamos juntos.
Porquê esse ar de desconfiança?
esse medo? essa raiva?

Vamos, dêem as mãos.
Com uma estrela na mão
E a palavra no olhar
Apenas a emoção
De convosco partilhar
Um Natal aqui tão perto
Que nunca foi descoberto

quinta-feira, junho 16

16/6/2005

o post de hoje nao era pa ser este..originalmente hoje devia estar a mandar um miminho a uma pessoa especial.infelizmente perdi a vontade..

Hoje li os jornais, recordei o dia de ontem e tive uma lágrima que me disse olá..é estranho...Nos jornais a cobertura é miníma e há sempre algo a apontar, nem mesmo no teu adeus eles sabem ser isentos..

Não ,me apetece escrever mais hoje, estou assim naqueles dias..

abraços

quarta-feira, junho 15

Obrigada

Foi a bocado que vim do adeus ao camarada...ele, se visse gostaria concerteza, milhares de pessoas dando vivas ao seu pensamento e á sua memória..jovens, menos jovens mas todos com uma certeza, a certeza de que portugal sem ele seria diferente para pior e que com as ideias dele não seriamos o triste portugal que somos, onde atingimos o nosso valor máximo quando infelizmente morremos,onde continuamos com todas as injustiças sociais como se fosse algo de aceitavél, onde o acesso á cultura, educação e saude é considerado um bem dispensável e de ricos..enfim, se seguissem o pensamento dele, como bem estariamos álvaro...Gritei o teu nome vezes sem conta, como continuarei a gritar sempre que me defronte de uma injustiça que tu própria combaterias..

obrigada camarada, amigo e professor

Até sempre Camarada Cunhal....

Bem parece que me vou iniciar nestas lides...ja andava há algum tempo para iniciar um blog mas achava que não estava na altura..hoje aconteceu algo que me empurrou para isso...Morreu o corpo do camarada Cunhal...Sim morreu, mas apenas o corpo.. as ideias, o seu pensamento, o deu ideal continua vivo ebem vivo de uma cor que acho ser do mais vivo possivel..VERMELHO..sim não ha que ter medo...È vermelho..Estou tristissimo, primeiro morre o general vasco,um grande lutador e camarada, depois o cunhal..Ha que ver e olhar para o homem como o homem que ele foi na verdade, não como o venderam ao longo de todos estes anos..ele é talvez dos homens mais inteligentes deste país, um lutador, um artista, um escritor, um político..Tentou fazer com que vivessemos numa verdadeira democracia, lutou para que as pessoas tivessem o que na sua maioria não têm..se calhar não me expresso bem mas é que estou muito emocionado..ficam aqui umas das palavras dele num dos seus livros, que penso retratarem o que tento dizer acerca das suas ideias.."O nosso ideal, dos comunistas portugueses, é a libertação dos trabalhadores portugueses e do povo portuguesde todas as formas de exploração e de opressão.È a liberdade de pensar, escrever, de afirmar, de criar.É o direito á verdade.È colocar os principais meios de produção, não ao serviço do eriquecimento de alguns poucos para a miséria de muitos mas ao serviço do nosso povo e da nossa pátria.É erradicar a fome, a míseria e o desemprego.é a expansão da ciência, da técnica e da arte..."Alvaro cunhal em "Um partido com paredes de vidro"abraço cunhal.